Título original: Doppelganger –
A Trip Into the Mirror World
Editora: Carambaia; 1ª edição
Ano: 2024
Doppelganger é uma palavra alemã que pode ser traduzida como “duplo ambulante”, ou sósia. Como a “réplica” de uma pessoa, que pode, contudo, comportar-se de forma totalmente diferente.
O termo foi cunhado pelo escritor alemão Jean Paul em sua obra de 1976, Siebenkas, mas as referências a fenômenos fantasmagóricos semelhantes ocorrem na mitologia e na psicanálise moderna. Não à toa, Doppelganger está na lista dos melhores livros de 2024 do New York Times, The Guardian, Time e Slate.
A vida da autora objeto desse artigo, Naomi Klein, se imbrica de forma surpreendente com a de outra escritora de sucesso (Naomi Wolf), famosa pelo radicalismo que abraçou recentemente.
Wolf, a Doppelganger de Klein, passou por uma metamorfose própria, partindo de uma posição de defesa de direitos feministas para a crítica política e finalmente para uma posição alucinada como teórica e propagadora de teorias conspiratórias.
Essa última persona de Naomi Wolf, afetou tanto Naomi Klein que a autora de Doppelganger, mesmo contra todo bom senso e não sendo seu campo de expertise, decidiu que não poderia mais adiar o enfrentamento da situação de confusão que a situação ensejava.
O que torna Doppelganger uma obra-prima é, sobretudo, a capacidade da autora, Klein, de conectar um drama pessoal seu, a confusão com sua quasehomônima nêmesis, com a polarização e fragmentação que ocorre em larga escala. Como a autora menciona, não apenas indivíduos possuem Doppelgangers.
Vemos nações e culturas com suas antíteses: democracias vs. autocracias, pluralidade vs. fascismo, secularismo vs. teocracias etc. Uma variedade de dimensões em um mundo-espelho. Seu mergulho no mundo-espelho, segundo ela, teve o empurrão decisivo na crise da pandemia de Covid em 2019.
Ela comenta que julgava possuir clareza de visão sobre assuntos complexos, mas que paulatinamente foi reconhecendo que isso não passava de distanciamento pessoal desses assuntos, o que desapareceu em face da pandemia global, que afetou a todos, incluindo sua família.
A repercussão de eventos extremos nas vidas das pessoas já está presente em outro best-seller de sua autoria, The Shock Doctrine, mas em Doppelganger as conexões entre diferentes temas se aprofundam e impressionam.
O livro possui 4 partes onde Klein explora o mundo-espelho e seus lugares de desinformação, realidades distorcidas e paralelas. Na primeira parte, descreve como a situação pessoal de confusão com sua “réplica” tomou lugar, comparando suas trajetórias.
Na segunda parte, adentra os mundos paralelos de desinformação, conspiração e alucinação. Na terceira parte, a autora mergulha nos perigos que esses lugares distorcidos representam, incluindo uma possível quebra de coesão social.
Na quarta e última parte, Naomi Klein propõe maneiras de enfrentar os desafios desses “lugares de desinformação” e formas de construção de entendimentos coletivos. Poucas obras como essa são tão conectadas com os dilemas dos dias de hoje, indubitavelmente.
Boa leitura!