Aridelmo José Campanharo Teixeira
Fundador da FUCAPE Business School e Secretário de Governo de Vitória/ES
Como a experiência adquirida como professor e doutor em Controladoria e Contabilidade pela USP contribuiu para a fundação da FUCAPE Business School?
Quando fui fazer o doutorado na USP, pensei: o Brasil precisa ter um polo desse em cada lugar e, como sou muito inquieto, meu intuito foi especialmente o de trazê-lo para a instituição em que trabalhávamos, a Ufes. Mas eu e o Valcemiro éramos os primeiros doutorandos de lá e então foi destoando um pouco a nossa vontade de fazer, a nossa pressa em fazer, com o ritmo natural da instituição na época. E foi aí quando nós decidimos. Quando você quer fazer alguma coisa, acha que tem capacidade de fazer, e o ambiente onde você está não lhe proporciona, então, se você acredita na sua tese, saia e vá construir o ambiente necessário! E foi exatamente por isso que deixamos uma carreira estável, vindo a pedir demissão, para realizarmos o nosso sonho: contribuir, de fato, uma forma incisiva para reproduzir e, se possível, até superar o que a gente estava recebendo no nosso doutorado em São Paulo. Então, a inspiração veio de um grupo de professores (entre eles o Sérgio Dias e Eliseu Martins), que 20 anos antes, se propôs a fazer um doutorado em um ambiente ainda hostil para as Ciências Contábeis – e conseguiram! Então, como discípulos, desafiamos a fazer em menos tempo, de modo que, em bem menos tempo o nosso doutorado já é nota 6, assim como o da USP. E, hoje, o nosso nível de produção internacional é maior do que o da USP. Dessa forma, seguimos buscando contribuir para melhorar o nível de educação do contador no Brasil inteiro.
Qual foi o maior desafio que enfrentou na presidência da FUCAPE?
O maior desafio foi convencer as pessoas de que era possível. Todo lugar que a gente chegava, logo no início tinham aqueles “desligadores de chave”, os quais nos advertiam do tamanho e da dificuldade que é fazer um programa de mestrado/doutorado de qualidade. É que muitas pessoas que não são abertas para inovação acham que se você não está no caminho que ela trilhou então você está no caminho errado. Mas não é assim! O mundo muda e, se você já trilhou um caminho uma vez, você pode, de outra vez, pegar uma variante de leve mais rápido, e foi o que nós fizemos. Pegamos a experiência da USP, revisitamos um ambiente internacional e passamos a levar todos os nossos doutorandos para fora; todos eles passam um ano no exterior para pegar novidade lá fora, e o principal é que montamos um centro de pesquisa. Todo o mundo começava montando uma graduação, uma especialização e depois chegava ao mestrado. Nós resolvemos reunir um grupo de pessoas que tinha pretensão de virar pesquisadores, terminando ou concluindo já o doutorado. Aí, sim, nós fomos montar nossa graduação, as especializações, ou seja, já um trilhando um percurso diferente, afinal, ousar um caminho novo é para quem deseja chegar em lugares novos. E fizemos tudo com muita ciência, muito estudo, planejamento estratégico, visão de médio e de longo prazo. Uma 64 | PERFIL 65 | PERFIL coisa muito importante nessa área é a nossa experiência de contador, que fez a diferença na gestão, com organização e muita informação para tomada de decisões.
Conte-nos um pouco sobre as áreas de pesquisa às quais você tem se dedicado nos últimos anos
Atualmente, dedico-me, especialmente, a usar a Ciência Contábil para auxiliar a gestão de escolas públicas, mais do que qualquer outra coisa. Isso porque enxerguei que o problema mais relevante do nosso país está na deficiência de montar alavancas que conduzam ao desenvolvimento sustentável mais inclusivo e igualitário. Isso é algo que nós, contadores, podemos contribuir de uma forma mais incisiva. Assim, nos últimos 5 anos, passei a me dedicar à modelagem e, inclusive, criamos uma linha de pesquisa no mestrado de Contabilidade, de gestão escolar. Estamos treinando diretores de escola que, geralmente, são pedagogos, educadores, e que nunca fizeram uma cadeira de gestão, mas que recebem uma empresa de médio porte pra cuidar.
Como a plataforma Inspira ES tem estimulado o livre exercício da cidadania?
Em 2018, depois de já ter realizado o objetivo de contribuir para a formação de muitos mestres e doutores de qualidade, movido pelo desejo de dar um retorno para a sociedade, montei a plataforma Inspira ES, pois vi que, como eu, muitas pessoas queriam doar tempo e conhecimento de forma voluntária, mas que também não sabiam como fazer isso. Foi então que pensei: vamos usar a tecnologia para esse fim! Com a plataforma, podemos juntar pessoas que queiram participar, segmentando por áreas de conhecimento que elas dominem. Assim, por meio de reuniões, a gente pode identificar problemas estruturais. Identificamos esses problemas e procuramos uma solução, misturando conhecimento e tecnologia, para que esta possa ganhar escala na área pública. Com isso, já estamos conseguindo produzir ferramentas de alto impacto, sendo que alguns viraram até startups e já estão faturando e resolvendo problemas sociais. Sinto-me muito feliz, embasado e seguro com esta iniciativa pela minha formação contábil. Com ela, nós, contadores, conseguimos rapidamente associar a relação de esforço e resultado, e isso é a cultura contábil aplicada gerando benefícios sociais.
Qual é a sua mensagem para os jovens empreendedores?
Todo o mundo trilha um caminho, mas o que faz a diferença é você, todo dia, levantar e visualizar, de forma clara, o seu objetivo de chegada. Ele pode inclusive mudar, adaptar-se nesse percurso, mas saber onde se quer chegar é essencial para que isso se torne realidade. Além disso, pode eliminar muita ansiedade e frustração que acometem a quem não estabeleceu sua linha de chegada. Quanto mais distante você estiver dela, mais resiliência terá que ter. Fique sempre se perguntando “Onde eu quero chegar?”, porque isso vai te dar exatamente a dimensão do esforço que você vai ter que fazer. E é necessário ter a convicção de que nada será dado, pois tudo tem que ser conquistado, tudo tem que ser convencido. Assim, frustrações acontecerão e a resiliência precisa existir para que você possa, efetivamente, agir contra as adversidades sem perder o foco das suas metas e consiga superar, dia após dia, os desafios desse percurso rumo ao sucesso que você almeja, de modo mais objetivo e eficaz.
Qual sua visão em relação aos profissionais da Contabilidade terem uma participação política mais ativa?
A convivência de qualquer espécie que vive em sociedade (não só a espécie humana), ou seja, as relações de um modo geral são mediadas pela política. Seja com a família, com vizinhos, etc. E você tem a política partidária, que tenta gerenciar a sociedade como um todo, não só o indivíduo específico e a relação dele com o outro, mas uma construção coletiva. Essa construção é muito árdua, principalmente se você tiver como meta o bem comum e, não, se não estiver envolvido com a política partidária. Agora uma coisa é certa: se os bons não entram na política, os maus vão entrar e quem vai sofrer a consequência é aquele que fez a opção por não entrar. Ou seja, vivemos a política de qualquer jeito, ou fazendo ou sofrendo as consequências de quem está fazendo. Então nesse sentido eu sou um atuante político e estou aqui neste momento sentado como secretário de governo da capital do Espírito Santo, mas continuo, professor, pesquisador, contador. E percebi o quanto o conhecimento como contador nos ajudou a mudar a realidade econômico-financeira da cidade com apenas dois anos. E o impacto está visível a todos que acompanham a gestão. Todos podem visualizar o quanto mudou a racionalidade da aplicação dos recursos públicos. Para se ter uma ideia, só na parte de tesouraria (quando atuei como secretário de Fazenda), só com as mudanças que fiz na área financeira, usando os conhecimentos que tenho como contador, aumentamos de 4,5 milhões para 130 milhões a receita do município sem cobrar a mais do contribuinte, apenas alocando melhor os recursos que já estavam à disposição da prefeitura. Por isso, é preciso convocar a classe contábil a ter um grupo político bem definido para que a gente possa contribuir positivamente para o destino da nossa cidade, do nosso estado, da nossa nação.
De que modo você enxerga a participação contínua do profissional da contabilidade no desenvolvimento das empresas?
A Contabilidade como área de conhecimento tem um rol de especializações. Mas, muitas vezes, essa especialização é tão grande que isso chega a restringir significativamente a participação e a relevância do profissional da contabilidade como agente de auxílio e participação ativa na gestão. E vivemos um cenário em que o contador é o profissional nato para assumir seu espaço nesta gestão de empresas, mas esse é um espaço que demanda muita qualificação. O contador tem o privilégio de estar com todos os dados das organizações na mão e tem o poder de transformar esse dado em informação. Contudo, para isso, é preciso saber como fazer modelagens que possam prever o futuro e não, simplesmente, demonstrar como foi o passado, sobretudo neste momento de novas tecnologias. Na nossa profissão, já passamos por mil inovações que iriam desempregar todos, a exemplo do computador, a internet, o software, mas, na realidade, essas inovações chegam para eliminar o trabalho burocrático e operacional. Aquele que não agrega valor agora para se manter atualizado é preciso ter esforço. Então é preciso refletir: se eu quero continuar gerando valor onde eu passo aí eu preciso me adaptar a essas tecnologias, saber lidar com elas, tomar as rédeas, por exemplo, aprender a perguntar da melhor forma ao Chat GPT, por exemplo, lançar mão das novas ferramentas e ressignificar a análise de dados para transformá-los em previsibilidade, que é algo de altíssimo valor, pela qual as organizações pagam e bem. Imagina se entidades de classe, como o CFC, venham a fomentar um grande BI, usando a inteligência artificial e a experiência de uma rede colaborativa de contadores, por exemplo! Isso é o futuro, criar e fomentar comunidades cooperativas.
Conheça mais sobre Aridelmo Teixeira
Executivo e empreendedor há mais de 25 anos. Entre outras empresas, é um dos fundadores da Fucape Business School, que se consolidou como a primeira e melhor escola de negócios de padrão internacional do Estado do Espírito Santo e que, desde 2010, está entre as 10 melhores Instituições de Ensino Superior do Brasil. A instituição está presente em 11 estados do país com programas de graduação, MBA, mestrado e doutorado.
No campo de responsabilidade social, atua como voluntário desde 2008 por meio do Movimento Espírito Santo em Ação – uma das principais organizações empresariais sem fins lucrativos do Espírito Santo, mantidas pelas principais empresas do estado.
Presidiu essa importantíssima ONG de 2016 a 2018. Em 2019, fundou e coordena a plataforma Inspira ES, uma rede em apoio às políticas públicas movida pelo livre exercício da cidadania, que já conta com mais de 200 voluntários.
Educação e Inovação fazem parte de sua história e o motivaram a empreender ao longo de toda a vida. Em 2002, concluiu o doutorado em Controladoria e Contabilidade pela USP. Também publicou vários artigos em periódicos de primeira linha e participou do desenvolvimento de mais de 60 produtos tecnológicos. Além disso, orientou 70 dissertações de mestrado e doutorado na área de Administração e Contabilidade.
Atuou como membro da Delegação Brasileira do ISAR/ UNCTAD (Intergovernmental Working Group of Experts on International Standards of Accounting and Reporting / United Nations Conference for Trade and Development) e foi coordenador-adjunto da Área de Administração, Contabilidade e Turismo da Capes, de 2011 a 2017 – área que agrega mais de 170 programas de mestrado e doutorado e mais de 3 mil docentes.
Os principais temas de pesquisa são Finanças, Contabilidade Gerencial Estratégica, Avaliação de Ativos, Qualidade dos Lucros, Accruais, IFRS, CPCs e IPSAS.