Análise do conteúdo informacional do valor agregado divulgado na DVA
Análise do conteúdo informacional do valor agregado divulgado na DVA
Por:
José Antonio de França
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Análise do conteúdo informacional do valor agregado divulgado na DVA

Edição 40
ISSN: 2357/7428
Julho, 2022
10 min

 versão em português

 versão em inglês

Este estudo, de forma resumida, conduz uma análise do conteúdo informacional da identidade contábil valor agregado (VA), divulgado na demonstração do valor adicionado (DVA), como uma proxy da identidade contábil Produto Interno Bruto (PIB). Os achados relevantes do estudo sinalizam que parte da assimetria entre as identidades contábeis, VA e PIB, pode ser mitigada com um rearranjo dos agregados econômicos da riqueza produzida e distribuída, e a outra parte pode requerer estudo mais aprofundado, inclusive de natureza conceitual. Para mitigar os efeitos da assimetria existente entre os dois agregados, VA e PIB, o estudo sugere a utilização da identidade contábil valor agregado total (VAT) que produz os erros de estimação que explicam a diferença de orientações entre a estrutura da contabilidade e o Sistema de Contas Nacionais (SCN).

Palavras-chave: Valor agregado. Conteúdo informacional do VA. Assimetria entre o VA e o PIB. Valor agregado total.

 

1. Introdução

O conteúdo informacional das demonstrações financeiras orientadas pelas normas de contabilidade é um dos instrumentos de monitoramento de gestão micro e macroeconômica, a considerar o ordenamento contabilístico como norteador de procedimentos de mensuração de grandezas econômicas no âmbito das organizações e das políticas públicas.

Esse ordenamento direciona o conteúdo informacional de cada demonstração, seja ela demonstração de conteúdo estático ou dinâmico, ou ainda como demonstração de estoques, demonstração de desempenho econômico-financeiro ou de contexto social.

A discussão deste resumido estudo orbita em torno da demonstração de contexto social denominada Demonstração do Valor Adicionado (DVA), cujo conteúdo informacional revela a riqueza gerada e distribuída por uma organização econômica, no horizonte de um período de tempo denominado exercício social ou ano fiscal. A riqueza produzida por todas as organizações econômicas, evidenciada na DVA, representa uma proxy do produto interno bruto (PIB) gerado pelas células microeconômicas produtivas, formalmente constituídas, em atividade em cada setor da economia.

Essa riqueza sinalizada pelo PIB é composta pela soma de todos os bens e serviços finais produzidos no território do país, cujos agregados econômicos são representados pela renda das famílias, renda do capital, compras do Governo, saldo da balança de pagamentos e carga tributária que onera todos os consumidores, diretamente e/ou indiretamente, mas que é necessária para custear a manutenção do Estado e financiar as políticas públicas. Essa definição qualifica o PIB, no critério de avaliação nominal, como argumenta Froyen (2002, p. 19).

O PIB, por qualquer que seja o critério de avaliação, é uma identidade contábil como argumenta Froyen (2002, p. 30), modelado pelo sistema de contas nacionais (SCN), orientado pela ONU e gerenciado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na mensuração da atividade econômica do país, em nível macroeconômico. O VA também é uma identidade contábil, orientada pelo arcabouço da contabilidade e não pelo SCN, cujo conteúdo informacional sinaliza a riqueza produzida e distribuída por uma organização econômica, em um determinado período de tempo, em nível microeconômico.

À semelhança da especificação do modelo que define a identidade contábil PIB, a identidade contábil DVA é especificada com as variáveis econômicas (a) renda das famílias, (b) renda do capital de terceiros, (c) renda do capital próprio e (d) carga tributária. Ainda que haja semelhança entre as duas identidades contábeis, há também diferenças porque o critério de mensuração da identidade contábil PIB é preço de mercado, enquanto que o critério de mensuração da identidade contábil DVA é preço de custo.

É relevante observar que a DVA não é formalmente contemplada pelo padrão IFRS que regula a contabilidade a nível global no planeta. Ela, a DVA, é um conteúdo informacional instituído no Brasil, de divulgação obrigatória para empresas abertas com títulos negociados no mercado de capitais e, opcional, para as demais entidades econômicas.

Mas em que pese o relevante conteúdo informacional da DVA, na geração e na distribuição da riqueza, em nível microeconômico, há de se observar as diferenças entre conceitos contábeis e conceitos econômicos para mitigar assimetrias existentes como, por exemplo, no conceito de lucro. Na contabilidade lucro é uma variável residual, enquanto que na economia lucro é insumo da produção. Outra diferença relevante a ser mitigada, já mencionada em parágrafo precedente, são os efeitos do critério de avaliação das identidades contábeis que na economia é preço de mercado e na contabilidade é custo.

 

 

2. Conteúdo informacional da DVA

A DVA revela o valor da riqueza produzida e distribuída pelas organizações econômicas, em um período de tempo denominado exercício social ou ano fiscal, em contexto microeconômico. A formação da riqueza parte da diferença entre o valor da produção, representada pela receita, e os custos transferidos de outras entidades econômicas que é suficiente, senão para eliminar, para mitigar os efeitos da dupla contagem na mensuração dos agregados econômicos. Daí a consideração de que esse conteúdo informacional da DVA é uma boa proxy para revelar a riqueza produzida e distribuída em nível agregado, se tomadas em conjunto a riqueza de todas as organizações econômica.

Pelo lado conceitual do lucro (positivo ou negativo), orientado pelo arcabouço da contabilidade, é interessante observar que pode haver geração negativa de riqueza e, neste caso, parte dos agregados da distribuição da riqueza, como renda das famílias e remuneração do capital de terceiros, é financiada por aporte de capital e/ou pela entropia dos ativos ou consumo do capital. Então, neste cenário, há uma revelação de que a riqueza distribuída a título de renda das famílias e remuneração do capital de terceiros é financiada pelo consumo de ativos que reduz o estoque de capital, afastando-o do estado estacionário ou “steady state” que sugere equilíbrio, como abordado por Mankiw (2008 – p.142).
Neste contexto, o conteúdo informacional da DVA permite observar, de forma objetiva, o movimento de sinergia ou de entropia de ativos (estoque de capital) sinalizando crescimento ou redução da organização econômica.

 

3. Modelos das identidades contábeis

Partindo da demonstração vertical da DVA, são observados dois grandes blocos de agregados econômicos: o primeiro bloco se refere à riqueza produzida, e o segundo bloco se refere à riqueza distribuída. No primeiro bloco, em termos econômicos, a riqueza produzida é a diferença entre a produção (receita bruta) e os insumos consumidos na produção. No segundo bloco a riqueza distribuída é a soma algébrica da renda das famílias, da carga tributária e da remuneração do capital. Todos esses agregados são demonstrados como resultado de um exercício social ou ano fiscal. É nessa temporalidade que reside uma das assimetrias entre as duas identidades contábeis, PIB e DVA, que é o saldo residual da produção ainda não vendida, que a identidade contábil PIB avalia a preço de mercado e a entidade contábil VA avalia ao custo. A partir desse contexto, o modelo algébrico que define o valor agregado (VA) demonstrado pela DVA pode ser assim especificado.

 

3.1 Modelo de avaliação do VA pela organização econômica

VA=RF+RC+T (1)
Em que RF é a renda das famílias; RC é a renda do capital (próprio e de terceiros); e T é a carga tributária.

O modelo especificado é para o VA de uma entidade econômica. O modelo é determinístico porque tem únicas entradas e produz um único conjunto de saídas e, por isso, não admite termo de erro.

Agora observe-se como é construído o modelo da identidade contábil PIB, especificado na Equação (2), que também se apresenta como modelo determinístico porque tem entradas definidas e admite um único conjunto de saída, porém mais amplo do que o modelo da identidade contábil VA.

PIB=C+I+G+(X-M) (2)

Em que C é o consumo das famílias; I é o investimento das organizações econômicas; G é o gasto do Governo e (X-M) é o saldo da balança comercial.

Então, como pode ser observado, há diferença relevante entre os modelos de cálculo das identidades contábeis VA e PIB exibidos nas Eq. (1) e Eq. (2). Esta diferença sinaliza que a riqueza produzida e distribuída pelos dois modelos não é equivalente.

Na busca de uma convergência entre os dois modelos propõe-se um modelo VA total (VAT), com introdução de um termo de erro, como especificado na Eq. (3), para mitigar a assimetria, fluir a comunicação e permitir melhor interpretação do conteúdo informacional. O modelo da identidade contábil VAT é econométrico e produzirá valores de erros estimados na aproximação das identidades contábeis VA e PIB, variando no tempo (t=1,2,…,n).

Assim, a especificação da identidade contábil VAT, com o termo de erro , captura as diferenças do saldo residual do estoque, do saldo da balança comercial e do critério de avaliação, por se tratar de um modelo de valor agregado. Para a estimação do quantum da identidade contábil VAT, utiliza-se o quantum da identidade contábil PIB como variável dependente.

 

 

4. Testando o modelo VAT

Nesta seção estão reproduzidos os resultados obtidos com a aplicação do modelo das Equações (1); (2) e (3). Na coluna “VA” estão os resultados obtidos com a Equação (1). Na coluna “PIB” estão os resultados obtidos com a Equação (2). Na coluna “Erros” estão os resultados obtidos com a Equação (3). Os erros são as proxies que explicam as diferenças entre os quanta das identidades contábeis VA e PIB produzidas pelo critério de mensuração, pelo valor residual dos estoques não vendidos e pelo saldo da balança comercial. 

 

5. Considerações gerais

Este estudo reduzido sinalizou que é possível melhorar o conteúdo informacional da DVA promovendo um rearranjo dos agregados econômicos, produção e distribuição da riqueza, para reduzir assimetrias entre as identidades contábeis VA e PIB, por meio da divulgação do valor dos estoques residuais que compõem a produção do período. As outras diferenças podem requerer estudos mais aprofundados, inclusive de natureza conceitual.

O VA é um conteúdo informacional valioso que, independentemente do porte da organização econômica, deveria compor o rol das informações básicas a serem divulgadas.

Ainda que o estudo seja resumido, espera-se que ele possa contribuir com acadêmicos, estudantes e profissionais de mercado no uso do conteúdo da informação econômica produzida pela DVA.

 

Referências

Froyen, Richard T. (2002). Macroeonomia. 5ª. ed. São Paulo, Saraiva.
Mankiw, N. Gregory. (2008). Macroeconomia. 6ª. ed. Rio de Janeiro, LTC.
SNC – System of Nacional Accounts. (2008). United Nations.

Analysis of the informational content of the added value disclosed in the SVA

This study, in summary, conducts an analysis of the informational content of the value-added (VA) accounting identity, disclosed in the statement of added value (SAV), as a proxy of the accounting identity gross domestic product (GDP). The relevant findings of the study indicate that part of the asymmetry between the accounting identities, VA and GDP, can be mitigated with a rearrangement of the economic aggregates of the wealth produced and distributed, and the other part may require further study, including of a conceptual nature. To mitigate the effects of the existing asymmetry between the two aggregates, VA and GDP, the study suggests the use of the total value-added accounting identity (TVA) that produces the estimation errors that explain the difference in guidelines between the Accounting Standards and the System of National Accounts (SCN).
Keywords: Added value. VA informational content. Asymmetry between VA and GDP. Total value-added (VAT).

 

1. Introduction

The informational content of financial statements guided by accounting standards is one of the instruments for monitoring micro and macroeconomic management, considering the accounting framework as a guide for procedures for measuring economic aggregates within the scope of organizations and public policies.

This ordering directs the informational content of each demonstration, whether it is a demonstration of static or dynamic content, or as a demonstration of inventories, demonstration of economic-financial performance or social context.
The discussion of this brief study revolves around the demonstration of social context called Statement of Added Value (SAV), whose informational content reveals the wealth generated and distributed by an economic organization, within the horizon of a period of time called fiscal year. The wealth produced by all economic organizations, evidenced in the SAV, represents a proxy for the gross domestic product (GDP) generated by the formally constituted productive microeconomic cells operating in each sector of the economy.

This wealth, signaled by GDP, is composed of the sum of all final goods and services produced in the country’s territory, whose economic aggregates are represented by family income, capital income, government purchases, trade balance and tax burden that, directly and/or indirectly, burdens all consumers, but it is necessary to pay for the maintenance of the State and finance public policies. This definition qualifies the GDP, in the nominal evaluation criterion, as argued by Froyen (2002, p. 19).

The GDP, by whatever evaluation criterion, is an accounting identity as argued by Froyen (2002, p. 30), modeled by the system of national accounts (SCN), guided by the UN and managed by the Brazilian Institute of Geography and Statistics (BIGS) in measuring the country’s economic activity at a macroeconomic level. The VA is also an accounting identity, guided by the accounting framework and not by the SCN, whose informational content signals the wealth produced and distributed by an economic organization, in a given period of time, at a microeconomic level.

Similar to the model that defines the GDP accounting identity, the VA accounting identity is specified with the economic variables (a) household income, (b) debt capital income, (c) equity income and (d) tax burden. Although there are similarities between the two accounting identities, there are also differences because the measurement criterion for the GDP accounting identity is market price, while the measurement criterion for the VA accounting identity is cost price.

It is relevant to note that the SAV is not formally covered by the IFRS standard that regulates global accounting on the planet. It, the SAV, is an informational content instituted in Brazil, of mandatory disclosure for publicly traded companies with securities traded on the capital market and, optional, for other economic entities.

However, despite the relevant informational content of the SAV, in the generation and distribution of wealth, at a microeconomic level, the differences between accounting concepts and economic concepts must be observed to mitigate existing asymmetries, such as in the concept of profit. In accounting, profit is a residual variable, while in economics, profit is an input to production. Another relevant difference to be mitigated, already mentioned in the previous paragraph, is the effects of the criterion for evaluating accounting identities, which in economics is market price and in accounting is cost.

 

2. SAV informational content

The SAV reveals the value of the wealth produced and distributed by economic organizations, in a period of time called fiscal year or fiscal year, in a microeconomic context. The formation of wealth starts from the difference between the value of production, represented by revenue, and the costs transferred from other economic entities, which is sufficient, if not to eliminate, to mitigate the effects of double counting in the measurement of economic aggregates. Hence the consideration that this informational content of the SAV is a good proxy to reveal the wealth produced and distributed at an aggregate level, if the wealth of all economic organizations is taken together.

From the conceptual side of profit (positive or negative), guided by the accounting framework, it is interesting to observe that there may be a negative generation of wealth and, in this case, the aggregates of wealth distribution, such as household income and third-party capital income, are financed by equity or by the entropy of assets that is consumption of capital. So, in this scenario, there is a revelation that the wealth distributed as household income and debt capital income is financed by the consumption of assets that reduces the capital stock, moving it away from the “steady state” that suggests balance, as discussed by Mankiw (2008 – p.142).

In this context, the informational content of the SAV allows observing, in an objective way, the movement of synergy or entropy of assets (capital stock) signaling growth or reduction of the economic organization.

 

3. Models of accounting identities

Starting from the vertical demonstration of the SAV, two large blocks of economic aggregates are observed: the first block refers to the wealth produced, and the second block refers to the wealth distributed. In the first block, in economic terms, the wealth produced is the difference between production (gross revenue) and the inputs consumed in production. In the second block, distributed wealth is the algebraic sum of household income, tax burden and capital income. All these aggregates are shown as a result of a fiscal year. It is in this temporality that one of the asymmetries between the two accounting identities, GDP and VA resides, which is the residual balance of production not yet sold, which the accounting identity PIB evaluates at market price and the accounting entity VA evaluates at cost. From this context, the algebraic model that defines the added value demonstrated by the SAV can be specified as such.
3.1 VA assessment model by the economic organization

VA=RF+RC+T (1)

Where HI is household income; CI is capital income (own and third parties); and T is the tax burden.

The specified model is for the VA of an economic organization. The model is deterministic because it has only inputs and produces a single set of outputs and, therefore, does not admit an error term.

Now, observe the GDP accounting identity model, specified in Equation (2), which also presents itself as a deterministic model because it has defined inputs and admits a single output set, but broader than the VA accounting identity model.
GDP=C+I+G+(X-M) (2)

Where C is household consumption; I is the investment of economic organizations; G is government spending and (X-M) is the trade balance.

So, as can be seen, there is a relevant difference between the models for calculating the VA and GDP accounting identities shown in Eq. (1) and Eq. (2). This difference indicates that the wealth produced and distributed by the two models is not equivalent.

In the search for a convergence between the two models, a total VA model (TVA) is proposed, with the introduction of an error term, as specified in Eq. (3), to mitigate asymmetry, flow communication and allow better interpretation of information content. The TVA accounting identity model is econometric and will produce estimated error values in the approximation of the VA and GDP accounting identities, varying in time (t=1,2,…,n).

Thus, the specification of the accounting identity TVA, with the error term , captures the differences in the residual balance of the inventory, the balance of the trade balance and the evaluation criterion, as it is an added value model. To estimate the quantum of accounting identity TVA, the quantum of accounting identity GDP is used as a dependent variable

 

4. Testing the TVA model

In this section are reproduced the results obtained with the application of the model of Equations (1); (2) and (3). In the “VA” column are the results obtained with Equation (1). In the “GDP” column are the results obtained with Equation (2). In the “Errors” column are the results obtained with Equation (3). Errors are the proxies that explain the differences between the quanta of the VA and GDP accounting identities produced by the measurement criterion, by the residual value of unsold inventories and by the balance of trade.

 

5. Final considerations

This reduced study indicated that it is possible to improve the informational content of the SAV by promoting a rearrangement of economic aggregates, production and distribution of wealth, to reduce asymmetries between the accounting identities VA and GDP, through the disclosure of the value of residual inventories that make up production of the period. The other differences may require further studies, including those of a conceptual nature.

The VA is a valuable informational content that, regardless of the size of the economic organization, should compose the list of basic information to be disclosed.

Although the study is summarized, it is expected that it can contribute to Scholars and market professionals in the use of the content of economic information produced by the SAV.

 

References

Froyen, Richard T. (2002). Macroeonomia. 5ª. ed. São Paulo, Saraiva.
Mankiw, N. Gregory. (2008). Macroeconomia. 6ª. ed. Rio de Janeiro, LTC.
SNC – System of Nacional Accounts. (2008). United Nations.