O Controle Interno na Administração Pública
O Controle Interno na Administração Pública
Por:
Thiago Bicalho Ribeiro Gomes
Print Friendly and PDF

O Controle Interno na Administração Pública

Edição 40
ISSN: 2357/7428
Julho, 2022
15 min

AUTOR

Thiago Bicalho Ribeiro Gomes

Servidor público e aluno de Pós-Graduação Instituto de Educação Continuada - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Pró-Reitoria de Pesquisa. Orientação do Professor Nilton de Aquino Andrade.

RESUMO

Entende-se que o controle interno é fundamental para que as organizações da Administração Pública alcancem os melhores resultados e, consequentemente, respeitem o preceito constitucional da Eficiência. Assim, almeja-se uma avaliação das principais características e benefícios, bem como os desafios para a adequada realização. Para tanto, será utilizada pesquisa sobre o tema, abordando as questões mais relevantes dos pontos positivos da adoção de um controle interno robusto, além das barreiras para a correta implantação no âmbito dos órgãos e entidades públicos.
PALAVRAS-CHAVE: Controle Interno. Benefícios. Relevância. Desafios.

 

1 INTRODUÇÃO

A etapa do controle, no âmbito do ciclo orçamentário, é extremamente importante, não só para o próprio processo do orçamento brasileiro, mas também para a própria gestão e governança da máquina estatal. E a referida etapa é dividida em externo e interno. Sobre este, observa-se que se trata de um processo (um meio), que poderá proporcionar a consecução de objetivos e, não, um fim em si mesmo, que, entre outros fatores, objetiva avaliar o cumprimento das metas do PPA – Plano Plurianual, bem como os programas do governo e o próprio orçamento da União. Cuida também do aspecto legal e dos resultados orçamentários, financeiros e patrimoniais, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado. Ainda, visa ao controle operacional de créditos, avais, garantias, direitos e haveres; verifica possíveis ilegalidades prévia, concomitante e subsequente, bem como apoia o controle externo.

O controle interno se configura como algo além da própria função administrativa, uma vez que subsidia o processo decisório dos gestores públicos, os quais não só têm o dever constitucional de serem eficientes, mas de observarem o Princípio da Legalidade estrita, atuando em conformidade com as legislações pertinentes. E nesse sentido Sarens, Vissher e Van Gils (2010) listam uma série de requisitos a serem observados pelo controle interno, tais como o foco no cumprimento dos objetivos sociais ou políticos; o uso de recursos públicos; a importância do ciclo de orçamento; a complexidade do seu desempenho; o amplo escopo de sua responsabilidade pública. Sob tal perspectiva, o presente estudo pretende analisar os objetivos, principais características e desafios do controle interno no âmbito da Administração Pública.

 

 

2 DESENVOLVIMENTO

O controle, juntamente com a avaliação, é última etapa do ciclo orçamentário no Brasil, processo este dinâmico, contínuo e flexível, o qual é composto ainda da elaboração da proposta orçamentária; discussão, estudo e aprovação da LOA – Lei Orçamentária Anual e execução orçamentária financeira.

Especificamente em relação ao controle, este pode ser dividido entre externo e interno, o qual é o objeto em comento, que, por tamanha importância, possui no âmbito da Administração Pública pátria, recebeu tratamento constitucional, conforme os artigos 70 e 74, da CF/1988, ora reproduzidos.

Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.

Parágrafo único. Prestará contas qualquer pessoa física ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta, assuma obrigações de natureza pecuniária.

Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de:
I – avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União;
II – comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado;
III – exercer o controle das operações de crédito, avais e garantias, bem como dos direitos e haveres da União;
IV – apoiar o controle externo no exercício de sua missão institucional.
§ 1º Os responsáveis pelo controle interno, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade, dela darão ciência ao Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.
§ 2º Qualquer cidadão, partido político, associação ou sindicato é parte legítima para, na forma da lei, denunciar irregularidades ou ilegalidades perante o Tribunal de Contas da União.

Nessa mesma esteira, a Lei nº 4.320/1964 que já regulava o assunto, dispõe, dentre outras coisas, que o Poder Executivo exerce os três tipos de controle, quais sejam, legalidade, fidelidade funcional e cumprimento do programa de trabalho. Tudo isso sem prejuízo da atuação dos Tribunais de Contas ou órgãos equivalentes. E no que se refere aos atos de execução orçamentária, a verificação da legalidade será prévia, concomitante e subsequente. Dispõe ainda a referida lei que, a qualquer tempo, poderá haver levantamentos ou prestações e tomadas de contas dos agentes responsáveis por bens ou valores públicos.

Consoante os citados dispositivos, percebe-se a importância do controle interno no âmbito da Administração Pública, sobretudo no Brasil, em razão da necessidade de se observar todo o arcabouço legal que rege e permeia as atribuições e competências dos gestores públicos. Pela perspectiva estrita do Princípio da Legalidade, em regra, o administrador público só poderá fazer o que esteja previsto em lei, além, é claro, de seguir vários outros preceitos, tais como o da impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

E sobre este último, repousa também outro aspecto importante do controle interno, que não se restringe à questão legal, vez que se materializa também como um processo integrado realizado pela gestão da entidade, projetado para lidar com os riscos e oferecer garantias de que a missão da entidade será cumprida, buscando atingir objetivos éticos, eficiência e eficácia operacional e econômica, segundo Intosai (2004).

Para além dos dispositivos e aspectos legais supra, a fim de corroborar essa perspectiva mais ampla, vale registrar também, a seguir, uma das definições mais usuais sobre controle interno (COSO, 1992, p.1):
Controles internos são um processo, conduzido pelo conselho de diretores, por todos os níveis de gerência e por outras pessoas da entidade, projetado para fornecer segurança razoável quanto à consecução de objetivos nas seguintes categorias:

  • eficácia e eficiência das operações;
  • confiabilidade de relatórios financeiros; e
  • cumprimento de leis e regulamentações aplicáveis.

Assim, em relação à atuação do controle interno nos três poderes, de forma integrada e que deve ser constantemente aperfeiçoado, espera-se uma considerável contribuição para a melhoria da governança, da accountability e da gestão fiscal e a atuação em conformidade com leis, regulamentos, padrões e práticas, ou seja, o próprio compliance. Nesse sentido, os sistemas de controle interno, em que pesem não terem o poder de garantir, podem auxiliar as organizações a promoverem a vigilância, fiscalização, monitoramento e verificações, a fim de se criarem mecanismos de observação, prevenção e correção, mitigando riscos e potencializando as chances de êxito em se alcançar os objetivos de forma adequada. E corroborando esse viés de redução dos riscos, para o COSO (1992), a melhor maneira de minimizá-los é justamente por meio de procedimentos de controle, que são políticas e ações estabelecidas para diminuirem os riscos e alcançarem os objetivos da entidade.

As atividades do controle interno devem ser criadas para contribuir com o alcance das metas, objetivos e missões da instituição, entre outras coisas, com ações corretivas que possibilitem a otimização dos recursos existentes, contudo, com um custo menor que os benefícios gerados.

Registra-se que o controle interno, além de ter caráter preventivo, objetive ainda, principalmente, a proteção dos ativos; a verificação da adequação e confiabilidade dos dados contábeis; o fomento do respeito às políticas da administração; a promoção da eficiência operacional; e a mitigação de erros e fraudes.

Classifica-se ainda o controle em formal, que é a verificação da legalidade dos gastos públicos, a conformidade com a legislação de regência e substantivo, que avalia, qualitativa e quantitativamente, se os recursos foram bem empregados. Em relação aos momentos do controle, considera-se prévio ao normatizar as ações, concomitante quando acompanha a execução orçamentária e, por fim, subsequente, quando realiza auditoria e avaliações. Claro, tudo isso com feedbacks e ajustes, de modo a retroalimentar esse fluxo.

Importante ressaltar que a implantação do controle interno nas instituições depende, entre outros fatores, de vontade política e alta gestão, da estrutura administrativa e funcional, orçamento e, claro, expertise da equipe responsável. Destaca-se ainda a necessidade de mudança cultural, de elaborar e aprimorar a gestão dos riscos dentro da esfera pública.

Além disso, no âmbito da administração pública, são necessários leis, decretos e portarias que disponham sobre a criação de sistemas e órgãos de controladoria, regulamentação do próprio funcionamento e nomeação de agentes específicos para tal atividade.

Outrossim, entre as várias atribuições do controle interno, citam-se:
• planejamento, coordenação e controle das próprias atividades;
• subsídio aos gestores;
• diagnóstico, orientação e refinamento de processos de trabalho necessários, além da identificação dos deficientes e irregulares;
• subsídio do controle prévio, concomitante e subsequente;
• capacitação de agentes;
• acompanhamento e verificação de conformidade das prestações de contas, contratos, convênios e demais ajustes;
• elaboração de relatórios de controle interno;
• certificação de aplicação de normas e procedimentos;
• promoção de auditorias técnicas em processos e documentos;
• auxílio aos Tribunais de Contas;
• proposição de providências para gastos públicos com economicidade, eficiência e eficácia;
• criação de canais e fomento à participação popular na fiscalização das ações e programas do governo;
• informação ao controlador geral sobre eventuais falhas, desvios ou irregularidades.

 
Sobre a elaboração de relatórios, uma das atribuições supra, de forma ilustrativa, cita-se o de Gestão, que é um conjunto de documentos, informações e demonstrativos de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional ou patrimonial, organizado para permitir a visão sistêmica do desempenho e da conformidade da gestão dos responsáveis por uma ou mais unidades jurisdicionadas durante um exercício financeiro (inciso II do art. 1º da Instrução Normativa TCU 63/2010). Assim, além de proporcionar uma prestação de contas à sociedade, torna-se um instrumento de autorreflexão para a gestão das instituições bem como aos órgãos de controle.

Oportuno também registrar a necessidade de monitoria dos próprios sistemas de controle interno, que devem ter objetivos claros, de modo a avaliar a qualidade de sua atuação ao longo do tempo, conforme Intosai (2007). Para tanto, pode-se utilizar separadamente ou concomitante, monitoramento contínuo e/ou avaliações específicas, sempre buscando mitigar situações irregulares, antiéticas, ineficazes, ineficientes e antieconômicas.

 

 

3 CONCLUSÃO

Dessarte, observa-se toda a importância dos sistemas de controle interno para a Administração Pública, haja vista o tratamento constitucional e legal reservado ao tema, além da ampla forma de atuação possível, dos inúmeros benefícios que podem ser proporcionados se as atividades forem adequadamente desenvolvidas no âmbito das instituições.

Mais que um controle formal, meramente de legalidade, há a preocupação também da avaliação e do acompanhamento qualitativo e quantitativo das ações dos gestores públicos. Norteando-se não só pelos inúmeros preceitos e legislações de regência, mas sobretudo pela indisponibilidade do interesse público, legalidade estrita e pelo dever de eficiência por parte da administração pública, o controle interno busca colaborar sobremaneira para que os objetivos e missões das instituições possam ser alcançados. Há que se destacar, porém, que a implantação de um controle interno robusto e que, de fato seja exitoso e colabore com os resultados da instituição, encontra importantes desafios e barreiras, como as supracitadas, para implementação e execução das atividades. 

É preciso forte apoio político, da alta gestão, bem como o envolvimento e engajamento de todo o corpo técnico, que precisa ser preparado e aperfeiçoado constantemente, diante de uma mudança cultural de buscar os melhores resultados, em conformidade com legislação e de forma a mitigar riscos fraudes e ainda refinar os processos de trabalho.

Portanto, tem-se que a Administração Púbica possui um grande caminho pela frente para alinhar as ações necessárias à implementação, aperfeiçoamento e fortalecimentos dos sistemas de controle interno, de modo a ser eficiente, eficaz e efetivo, entregando os melhores resultados à sociedade.

 

REFERÊNCIAS
ANDRADE, Nilton de Aquino. Controle Interno, Auditoria, Controle Externo, Fiscalização e Portal da Transparência. Material Curso MBA em Administração Pública. Setembro/2021.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Último acesso em: 18 out. 2021. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.
______. Lei n.º 4.320/1964. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l4320.htm (Último acesso em: 18 out. 2021);
CRUZ, Carlos Eduardo Rodrigues. Sistema de Controle Interno Integrado da União: Necessidade ou simples obrigatoriedade? Tribunal de Contas da União (TCU), Controladoria Geral da União (CGU). Disponível em https://portal.tcu.gov.br/biblioteca-digital/sistema-de-controle-interno-integrado-da-uniao-necessidade-ou-simples-obrigatoriedade.htm. Último acesso em: 18 out. 2021.
MONTEIRO, Renato Pereira. Análise do Sistema de Controle Interno no Brasil: objetivos, importância e barreiras para sua implantação. Revista Contemporânea de Contabilidade, vol. 12, número 25, enero-abril, 2015, pp. 159-188. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, Brasil.
OLKOWSKI, Gustavo Ferreira. Avaliação de Controles Internos na Administração Pública Federal. Tribunal de Contas da União (TCU), Controladoria Geral da União (CGU). Disponível em https://portal.tcu.gov.br/biblioteca-digital/avaliacao-de-controles-internos-na-administracao-publica-federal.htm. Último acesso em 18/10/2021.